sua obra reavaliada
e colocada num patamar de destaque recentemente.
O autor tem consciência dos verdadeiros problemas brasileiros,
ao mesmo tempo em que critica aquele nacionalismo ufanista, exagerado,
utópico, herdado do Romantismo - sendo essas características que o situam
dentro do Pré-Modernismo. Outra característica que o aproxima do Modernismo,
sendo um dos maiores motivos de críticas pelos ainda parnasianos de sua
época, é seu estilo: leve, fluente, propositadamente frouxo para os padrões
do final do século XX (aproxima-se da linguagem jornalística, estilo usado
por muitos autores após 1922).
Todas as características de Lima Barreto, como a dose certa
de crítica, análise e humor, estão presentes em "Triste fim de Policarpo
Quaresma" (1911). O tema central do livro é o nacionalismo exagerado,
porém sincero, de "Policarpo Quaresma". Um nacionalismo perigoso, quando
manipulado por mãos férreas como as do Marechal Floriano Peixoto. Este
livro antecipa os regimes nazi-fascistas que ganhariam corpo a partir
da década de 1930: para engrandecer a pátria, só um governo forte, ou
mesmo a tirania.
Lima Barreto critica a forma como as mulheres eram educadas
(uma educação que só as preparava para o casamento), sendo um dos primeiros
defensores do voto feminino; critica o exagerado militarismo da política
brasileira, assim como a República, que nos levou à ditadura de Floriano
Peixoto.
O universo de personagens criados por Lima Barreto está repleto
de políticos ineficazes e poderosos, de ignorantes que passam por sábios,
de militares incapazes e tirânicos. A esse mundo de privilegiados ele
opõe as figuras do subúrbio, uma multidão de oprimidos, mostrando suas
aspirações e sua revolta contra uma ordem social injusta. Os bairros pobres
do Rio de Janeiro recebem especial destaque, sendo o local onde se passa
a ação de seus romances, com o autor retratando de forma precisa a vida
nos subúrbios cariocas e sua gente humilde.
Lima Barreto documenta acontecimentos importantes da vida
republicana, prendendo-se à sua realidade histórica.
O autor acreditava na literatura como uma forma de estimular
o leitor a refletir e lutar por seus direitos. Daí serem temas comuns
em sua obra: a questão racial; a denúncia da hipocrisia e das falsas aparências;
a denúncia da associação de dinheiro a prestígio; critica a burocracia
medíocre e inútil.
Um traço autobiográfico está presente em todos os romances
de Lima Barreto, com suas experiências sendo transpostas em alguns personagens,
principalmente negros e mestiços, que sofrem o preconceito racial.
O nacionalista
Policarpo Quaresma
"Como de hábito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma,
bateu em casa às quatro e quinze da tarde. Havia mais de vinte anos que
isso acontecia. Saindo do Arsenal da Guerra, onde era subsecretário, bongava
pelas confeitarias algumas frutas, comprava um queijo, às vezes, e sempre
o pão da padaria francesa. Não gastava nesses passos nem mesmo uma hora,
de forma que, às três e quarenta, por aí assim, tomava o bonde, sem erro
de um minuto, ia pisar a soleira da porta de sua casa, numa rua afastada
de São Januário, bem exatamente às quatro e quinze, como se fosse a aparição
de um astro, um eclipse, enfim um fenômeno matematicamente determinado,
previsto e predito. A vizinhança já lhe conhecia os hábitos e tanto que,
na casa do Capitão Cláudio, onde era costume jantar-se aí pelas quatro
e meia, logo que o viam passar, a dona gritava à criada: 'Alice, olha
que são horas; o Major Quaresma já passou.' "
(Trecho do primeiro capítulo de "Triste fim de Policarpo Quaresma).
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