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ÁLBUM DE RECORDAÇÕES - 12 - ADELINO SERRAS PIRES (Caçador, industrial de turismo e promotor de Safaris) Aos 75 anos, um semblante marcado por muitas desilusões! Adelino Serras Pires foi dos caçadores mais polémicos que conheci em Moçambique! Senhor de uma personalidade invulgar, o seu relacionamento com as pessoas funcionava em função dos pontos de vista que cada um defendia. Ele era ( e ainda é), um homem frontal e cheio de convicções. Exigia de si próprio e dos seus subordinados grande disciplina e rigor no trabalho, criticando sempre aqueles que não cumpriam estes parâmetros. Discordar dos seus pontos de vista era, à partida, um desafio ao desentendimento e isso afastou muita gente do seu caminho, incluindo alguns colegas de profissão. Também não era fácil o seu relacionamento com as autoridades coloniais, que criticava com frequência a propósito de abusos de poder, favorecimentos e outras injustiças sociais. Isso causava-lhe, como se calcula, muitos dissabores.
Tornou-se muito conhecido não só no mundo da caça como no meio comercial e turístico da região centro de Moçambique. Esteve ligado, entre outras actividades, à empresa familiar que se dedicava ao comércio e agricultura nas regiões de Tete e Guro; era sócio de uma Agência de Turismo na cidade da Beira, que foi uma das pioneiras da indústria do turismo cinegético em Moçambique como concessionária de uma coutada oficial e tinha também a concessão hoteleira do Parque Nacional da Gorongosa. Em meados da década de 60 atingiu o seu ponto alto na indústria dos safaris de caça fazendo parte da direcção técnica e da própria administração da Sociedade de Safaris de Moçambique (SAFRIQUE), cargo que exerceu até fins de 1973, altura em que esta empresa decidiu encerrar as suas coutadas devido à acção das guerrilhas. Em 1974 dirigiu os safaris da Moçambique Safarilândia, outra conceituada empresa do turismo cinegético em Moçambique que tinha a concessão da Coutada oficial nº 5 e do Parque Nacional do Zinave, junto das margens do rio Save.
Ele lutou denodadamente pela reactivação das coutadas de Manica e Sofala, após o 25 de Abril de 1974, conseguindo acordos com os comandantes locais da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), mas a política imposta pelos novos governantes relativamente à caça não permitiram continuar os safaris em Moçambique.
Conheci este homem no início da época de caça de 1963, quando fui designado para supervisionar o safari oficial dos Marqueses de Villaverde, de Espanha, que foram a Moçambique como convidados do Presidente da República Portuguesa. Este safari decorreu nas Coutadas de Manica e Sofala e teve início na Coutada 9 que estava concessionada precisamente à Agência de Turismo da Beira, de que o Adelino era sócio gerente. Esta Coutada situa-se na região do Guro, a cerca de 450 quilómetros da Beira, onde a família Serras Pires possuía uma quinta agrícola e lojas comerciais.
O Adelino e o José Simões (1) foram os organizadores do safari e guias principais dos quatro elementos da comitiva dos Marqueses, secundados por outros caçadores guias, nomeadamente Carlos Costa Neves, Luís Santos, Mariano Ferreira, Francisco Coimbra e Victor Cabral. O safari foi um sucesso e teve cobertura jornalística especial, sendo por isso muito divulgado no estrangeiro, sobretudo em Espanha.
No final do safari dos Marqueses, em 1963, no acampamento de Kanga N'Thole (Coutada 1) os convidados e colaboradores posando junto dos troféus. Da esquerda para a direita: o autor desta página, José Simões (da Simões Safaris), Marqueses de Villaverde, Loli Aznar, Adelino Serras Pires, Luis Santos e três trabalhadores segurando peles. (Foto do jornalista Adérito Lopes)
Os Marqueses de Villaverde e seus acompanhantes (o financeiro Eduardo Aznar e esposa Loli ), voltaram no ano seguinte para novo safari. O Adelino foi novamente um dos guias principais, repetindo-se o sucesso do ano anterior. Fomos de novo companheiros nesta missão e entre nós ficou uma amizade bem sólida!
O sucesso destes safaris, aliado a outros igualmente bem sucedidos noutras coutadas de Manica e Sofala, Inhambane e Gaza, em que participaram individualidades da alta finança, escritores, artistas de cinema e outros famosos coleccionadores de troféus, foi rapidamente conhecido praticamente em todo o mundo. Moçambique passou, em consequência disso, a ser procurado por muitos caçadores turistas, nomeadamente de Espanha e dos Estados Unidos da América. A partir daí os calendários dos promotores de safaris passaram a estar preenchidos, com reservas de um e mais anos de antecedência!
Com Stuart Roosa, comandante da Apollo 14, junto de uma palapala, abatida na coutada 6. (Foto extraída do Livro "Ventos de Destruição")
As Coutadas de Manica e Sofala, que na altura tinham excelentes condições quanto a quantidade e diversidade de animais, não possuíam, contudo, infra-estruturas capazes de receber a avalanche de clientes que após os safaris dos Villaverdes procuraram Moçambique. Os seus concessionários também não estavam capitalizados para melhorar a indústria de safaris. Felizmente que, em 1964, no auge da euforia que a indústria dos safaris atravessava, o Banco Nacional Ultramarino (Banco emissor de Moçambique), criou a empresa SAFRIQUE, congregando a maioria das coutadas de Manica e Sofala e seus concessionários. Em boa hora esta iniciativa surgiu porque foi dada uma nova dinâmica a esta indústria. Fizeram-se avultados investimentos na construção e apetrechamento de acampamentos nas 9 coutadas concessionadas à empresa, abertura de picadas e campos de aviação, remodelação da frota de viaturas, instalação de uma eficiente rede de rádios transmissores receptores, assim como outros melhoramentos. Com estas melhorias e dotada de excelentes profissionais, quer na direcção quer ao nível dos caçadores guias, o fluxo de turistas caçadores às coutadas da Safrique aumentou de tal forma que a empresa se deu ao luxo de seleccionar os seus clientes, aumentar os custos dos safaris e estabelecer períodos de duração mínima obrigatória dos mesmos, mais favoráveis financeiramente.
O Adelino (à direita), preparando-se para conduzir um safari com convidados da Safrique nas coutadas de Marromeu, em 1973, utilizando um tractor anfíbio que proporcionava excelente movimentação nos terrenos alagados das planícies daquela região costeira de Moçambique. (Foto do autor desta página)
O Adelino Serras Pires, que resistira inicialmente à participação neste projecto, acabaria por se associar e fazer parte dos quadros superiores da Safrique. Para além de técnico responsável pela organização e supervisão dos safaris, ele foi o embaixador itinerante da empresa em todo o mundo, divulgando o potencial faunístico das suas concessões de caça e promovendo os safaris. Contribuiu assim, para o extraordinário sucesso da Safrique, que foi considerada nas décadas de 60 e 70 a maior e mais bem organizada empresa de safaris de caça em África!
O emblema dourado da SAFRIQUE, que os funcionários da empresa ostentavam com orgulho.
A mudança política ocorrida em Moçambique, em 1975, com a sua independência, levaria ao fim dos safaris, entretanto já afectados desde 1970 pela acção da guerrilha dos nacionalistas da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique). O Adelino e a maioria dos caçadores guias tiveram que abandonar o país e demandaram outros países africanos onde continuaram a sua actividade. Começou por Angola e durante cerca de dez anos deambulou por outros países potenciais detentores de animais selvagens de interesse para os coleccionadores de troféus e amantes da caça, nomeadamente, Rodésia (actual Zimbabwe), África do Sul, Quénia, República Centro Africana, Sudão, Zaire e Tanzânia. Foram dez anos de constantes sobressaltos, saltando de país em país sempre que a instabilidade política local, ou outros factores, a isso obrigava.
A fuga de Angola (Foto extraída do Livro "Ventos de Destruição")
Durante cerca de 25 anos ligado à indústria dos safaris conheceu e caçou nos melhores locais de caça do continente africano e foi anfitrião e guia de caça de grandes figuras, como Presidentes de República, Astronautas, Aristocratas, Financeiros, Políticos, Artistas e Escritores famosos. Foram anos de uma vida plena de emoções e muito gratificante pelas amizades que fez e que lhe proporcionaram, ao longo da sua vida, viagens e estadias nos lugares mais sofisticados do mundo. Apesar de estar desligado dos safaris há vários anos, o Adelino continua a participar com regularidade nas convenções anuais de caça promovidas pelas prestigiosas organizações, International Safari Club, Dallas Safari Club, Houston Safari Club e International Professional Hunters Association, de que é membro, mantendo-se assim em permanente contacto com o mundo da caça e com os seus amigos e operadores de safaris de caça de todo o mundo.
Com o seu particular amigo Valery Giscard D'Estaing, em 1976, no Parque Nacional de Chambord, em França. (Foto extraída do Livro "Ventos de Destruição")
Naturalmente que viveu também momentos atribulados e arriscou muitas vezes a sua própria vida devido às mil e uma situações inesperadas que acontecem no dia a dia do mato africano e na caça. As próprias guerras internas decorrentes nos países africanos por onde andou, incluindo Moçambique, arrastaram-no, por vezes, voluntária ou involuntáriamente, para situações críticas que lhe causaram muitos sofrimentos, frustrações e avultados prejuízos. Não esquece também perseguições e espoliações engendradas por certos concorrentes desonestos, que movidos pela inveja e pela ganância o atraiçoaram e prejudicaram quando estava no top dos safaris e em certas posições conseguidas à custa de muito trabalho e dinheiro.
Mas o maior drama da sua vida estava reservado para Moçambique, a sua terra de coração, com a conivência das autoridades da Tanzânia. Em fins de Agosto de 1984, poucos dias depois de ter terminado um bem sucedido safari naquele país da África Oriental, com o seu amigo e ex-Presidente de França, Giscard D'Estaing e família, foi detido por agentes dos serviços secretos tanzanianos, juntamente com seu filho Adelino Serras Pires Júnior (Tim-Tim), seu sobrinho Carlos Artur (Caju) e Rui Monteiro, também parente da família Serras Pires, que igualmente se encontravam a conduzir safaris no mesmo país. Foram enviados para a capital de Moçambique, amarrados de pés e mãos e de olhos vendados. Ali foram encarcerados em celas separadas e mantidos sob permanentes interrogatórios e sevícias durante quase cinco meses, sob a acusação infundada de serem inimigos do povo moçambicano e estarem na Tanzânia a preparar um golpe para derrubar o governo de Moçambique em conluio com a Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), com a CIA, com os "terroristas de Lisboa" e com Giscard D'Estaing.
Velhas contas que a Frelimo tinha com o Adelino desde os tempos em que ele enfrentou e repeliu os seus guerrilheiros quando estes atacavam os acampamentos de caça da Safrique!
O Livro "Ventos de Destruição", que o Adelino escreveu recentemente com a escritora Fiona Capstick, relata em pormenor esta aterradora história, cujo epílogo foi a devolução dos prisioneiros à liberdade depois de cerrada e permanente intervenção de algumas individualidades, governos e organizações internacionais, com destaque para o General Ramalho Eanes (na altura Presidente de Portugal), de Valery Giscard D'Estaing, da Cruz Vermelha Internacional, do Crescente Vermelho, da Amnistia Internacional, da International Hunting and Game Conservation, do Gabinete do Rei de Espanha, da Família Aznar, etc, etc,. Foi um capítulo doloroso de uma longa vida cheia de aventuras, paixões, emoções e também de muito amor a Moçambique.
Uma obra que apesar da singela apresentação como "Memórias e aventuras de caça em Moçambique", ela é, para além disso, um documento histórico de relevante importância.....
Os contactos que tive com este homem, quer durante os safaris dos Villaverdes em 1963 e 1964, quer ao longo dos anos que se seguiram e que culminaram com a mudança política em Moçambique, em 1975, ajudaram a conhecê-lo com alguma propriedade. Era um caçador discreto e bem organizado, nunca fazendo alarde dos seus feitos mesmo quando os seus clientes obtinham troféus raros ou abatiam animais de difícil aproximação e abate, nomeadamente búfalos, elefantes, leões e leopardos. Conhecia bem o mato e os animais selvagens, fruto de uma vida familiar ligada ao interior onde as caçadas eram o passatempo preferido e por vezes obrigatório quando se tratava de abater animais perigosos que atacavam as populações rurais. Ele iniciou as suas lides venatórias quando tinha apenas oito anos de idade acompanhando seu pai e um tio a uma caçada a leões devoradores de pessoas, perto de Tete, caçada essa que culminou com o abate de cinco destes felinos e a captura de duas crias. Depois dessa perigosa e emotiva experiência, que se encontra narrada no livro "Ventos de Destruição", seguiram-se outras idênticas e depressa se tornou um apaixonado pela caça. Escreveu, no mesmo livro, a propósito da sua iniciação nas lides venatórias, o seguinte:
Foi ainda antes da adolescência que entrei numa fantástica espiral de aprendizagem com o meu pai a respeito do mato africano, da caça, das armas de fogo e da vida selvagem em geral. ................................................................................................................... O meu pai ensinou-me praticamente tudo o que sei a respeito da vida e do mato africano. Houve três coisas, muito em particular, que ficaram gravadas na minha memória e que constituem preceitos aplicáveis à vida em geral: defende o teu terreno; nunca vires as costas; enfrenta o perigo! Para além disso, também me instilou um amor selvagem por África, amor esse que alimentou uma subsequente e nunca minorada fúria perante os ultrajes que a minha geração iria acabar por sofrer. (Pág.s 34 e 35)
Para além dos conhecimentos de caça, da vida selvagem e do mato africano, o Adelino reunia ainda um conjunto de condições que o creditavam como um dos guias de caça turística melhor preparados em Moçambique. Falava fluentemente duas das línguas estrangeiras mais utilizadas pelos clientes (inglês e espanhol); falava o Afrikanse (uma das duas línguas oficiais da África do Sul, o que lhe permitia entender-se com algum desembaraço com alemães, belgas e holandeses uma vez que as respectivas línguas têm muito de comum); dominava as duas principais línguas nativas da região de Manica e Sofala e Tete (chissena e chinyungwe); era dotado de uma excelente compleição física ( mais de um metro e oitenta de altura), bem musculada e equilibrada em peso; tinha muita prática de enfermagem e conhecia as principais doenças tropicais; Era um excelente mecânico auto; cozinhava óptimos pitéus à base de produtos da caça; tinha uma cultura geral acima da média, fruto da sua formação em escolas inglesas de renome, na antiga Rodésia (actual Zimbabwe) onde completou o curso secundário de Cambridge. Para além da formação académica, recebeu também preparação militar graduada com o nível de sargento-cadete e praticou uma vasta gama de actividades desportivas, nomeadamente, boxe, ténis, futebol, râguebi, críquete, polo aquático e hóquei em campo.
Escreveu a propósito da sua vida de estudante, o seguinte:
Muito francamente, estava farto da vida académica e aquela viragem nos acontecimentos reforçou o meu desejo de voltar a Moçambique, o meu primeiro amor. As suas terras bravias, a espantosa vida animal, as belas praias, o povo hospitaleiro, e uma atmosfera de tolerância geral e de harmonia tinham há muito escravizado a minha alma Queria voltar para casa. (Pág. 45 do Livro "Ventos de Destruição")
Moçambique era, de facto, a sua terra de coração. Para ali fora com apenas oito anos de idade e toda a sua família criara raízes muito fortes naquele território. Seu pai, fora para aquela colónia portuguesa em 1933, fixando-se primeiro em Tete e depois no Guro onde construiu e dirigiu uma vasta rede de lojas de comércio e uma quinta agrícola de grandes dimensões.
Foi na quinta do Guro que conheci o patriarca Serras Pires, no já longínquo ano de 1963. Ele e sua esposa, a "indomável" Dona Maria, logo me "perfilharam" e na sua casa tive sempre, ao longo dos anos que trabalhei na Província de Manica e Sofala, um lugar à mesa e um quarto para pernoitar. Era um regalo fazer uma pausa naquele oásis recheado de todas as comodidades, depois das cansativas viagens que fazia na região e consolava-me conversar com os simpáticos anfitriões, sempre dispostos a prolongadas cavaqueiras. Aliás, era prática corrente desta simpática e hospitaleira família receber na sua casa quem passava pelo Guro, uma povoação situada no caminho para Tete e muito longe dos meios desenvolvidos!
Tenho esperança de voltar àquelas longínquas paragens e visitar o local onde o saudoso pai Serras Pires se encontra sepultado, por vontade própria manifestada em vida. Ele levou-me um dia a visitar esse local, situado num ponto elevado, com árvores frondosas por si plantadas e não longe da residência. Dali se vislumbrava a imensidão e beleza da quinta com as belas montanhas recortando o horizonte. Explicou-me que fora nesse preciso local onde acampou pela primeira vez quando foi escolher o lugar para criar a sua quinta. Viria depois a elegê-lo como o ponto sagrado onde um dia gostaria de ser sepultado. Os filhos cumpriram e só lamentam terem sido impedidos de dar seguimento à grande obra do seu progenitor. Viram-se forçados a sair de Moçambique e perderam todo aquele império comercial e agrícola que era o baluarte da família. Só muito recentemente, volvidos mais de 25 anos, o Adelino pôde visitar aquele local sagrado da família, sujeitando-se ao choque e à profunda tristeza que o desolador cenário lhe provocou: tudo literalmente destruído! Os edifícios comerciais e agrícolas e a bela mansão da quinta foram reduzidos a escombros durante esses 25 anos. A propriedade voltou a ser o mato selvagem de outrora e a campa rasa do velho patriarca sofreu também do abandono e do vandalismo!
José Serras Pires em 1937, junto de uma leoa devoradora de homens, abatida perto de Tete. (Foto extraída do Livro "Ventos de Destruição")
UMA HOMENAGEM MERECIDA
A propósito da publicação do seu já famoso livro "Ventos de Destruição", cujo lançamento da versão em inglês ocorreu nos USA em 2001 e da versão em Português, em Lisboa, em 2002, um grupo de amigos homenageou em 27 de Setembro último os seus autores, o Adelino e sua companheira Fiona Capstick, que vivem na África do Sul e estiveram recentemente em Portugal de visita a seus familiares. Mais de meia centena de pessoas reuniram-se com os homenageados num almoço, em Lisboa, testemunhando-lhes o seu apreço pela obra em causa. Muitas outras pessoas enviaram mensagens associando-se à homenagem.
O simpático casal Fiona e Adelino no dia da homenagem em Lisboa.
A esse grupo de amigos se juntou o autor deste Álbum, que assim teve a oportunidade de rever um velho amigo e de conhecer a simpática Fiona! A ambos reafirmei o que já escrevera a propósito do seu Livro: uma obra que apesar da singela apresentação como "Memórias e aventuras de caça em Moçambique", ela é, para além disso, um documento histórico de relevante importância, no que à caça e à indústria dos safaris diz respeito, pois aborda com genuína lucidez e autenticidade o nascimento e a morte da indústria dos safaris de caça em Moçambique da época colonial. Dá-nos a conhecer, também, o que se passava noutros países africanos que conosco competiam nesta indústria e fica-nos (a nós e a todos que tinham essa convicção) a consoladora certeza de que não estávamos enganados quando afirmávamos que Moçambique tinha as melhores condições de toda a África para oferecer os melhores safaris do continente. Infelizmente os ventos de destruição mataram essas convicções e só temos que lamentar os nossos irmãos moçambicanos das gerações presentes e futuras, que não tiveram nem terão o privilégio de conhecer o rico património que era a fauna selvagem, que enchia as matas, as savanas, os rios, os lagos, as planícies e as montanhas de norte a sul do seu país e que se tivesse sido preservado, como nós o fizemos, seria uma grande fonte de divisas para o Estado e um potencial celeiro de proteínas para o povo.
Mas também reafirmei ao Adelino quanto apreciei a justeza das suas afirmações e condenações sobre o processo de descolonização (ele e nós nunca estivemos contra a descolonização, simplesmente condenamos a forma como foi feita e conduzida pela parte portuguesa) e os males que daí resultaram não só para os portugueses como para os próprios moçambicanos. Aliás, esta posição foi tomada de uma forma geral por todos os amigos presentes, que muito compreensívelmente pouparam o homenageado a recordações funestas sobre a forçada odisseia por ele vivida e sofrida, juntamente com três seus familiares, durante o cativeiro na Tanzânia e nas masmorras da Machava, em meados da década de 80.
O Livro "Ventos de Destruição" (que também é um grito de revolta de um dos mais inconformados espoliados das ex-colónias portuguesas em África), é o primeiro documento consertado e fiel sobre o turismo cinegético em Moçambique da época colonial, pelo que fará parte dos anais da história da fauna bravia, caça e caçadores de Moçambique, que a seu tempo terá de ser feita em profundidade e para a qual vamos dando a nossa modesta contribuição nesta página.
O Adelino e a Fiona estão de parabéns pois fazem já parte dessa história!
O autor desta página com o Adelino e a simpática Mamã Teresa, proprietária do Restaurante onde se efectuou o almoço de homenagem no dia 27 de Setembro último. (2)
Sirvo-me das palavras finais do Adelino, no seu Livro, para encerrar estas notas, pois elas são muito gratificantes para a memória de todos aqueles que tiveram o privilégio de viver os tempos áureos do nosso querido Moçambique!
Agora que estou a chegar ao fim da picada, depois de uma vida cheia e aventurosa, compreendo com mais clareza que foi a minha geração, sem qualquer dúvida, que experimentou o melhor de África e da sua incomparável vida selvagem! (Pág. 317)
Marrabenta, Outubro de 2003 Celestino Gonçalves
FONTES: a)- Memória e apontamentos do autor; b)- Livro "Ventos de Destruição"
(1) - Ver Álbum nº 6 - JOSÉ JOAQUIM SIMÕES (Simões Safaris); (2)- Ver colecção de fotografias do almoço de homenagem em: http://www.macua.com/temp/adelinofotos.html
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