BOLETIM DA DIRETORIA DE CRIAÇÃO NÚMERO 73

BRUCELOSE

É uma zoonose, doença capaz de ser transmitida ao homem pelos animais infectados. Portanto, todo criador deve ter o mínimo de conhecimento, pois, se não fizer um controle da doença no seu plantel, pode ser responsabilizado tanto pela contaminação dos seus animais como pela possibilidade da propagação da doença para o homem.

A brucelose, também conhecida por febre do Mediterrâneo, febre de Malta, febre de Gibraltar, febre de Chipre, doença de Bang e febre ondulante (pela remitência do seu quadro febril), foi estudada mais profundamente em 1887, em Malta, pelo médico escocês David Bruce que estabeleceu os seus agentes etiológicos. Em 1977 foi isolada de cães na Argentina. Sabe-se que é provocada por bacilos(alguns autores falam em cocobacilos) muito pequenos, aeróbios (necessitam de meios oxigenados para sobreviverem) Gram negativos (submetidas a um método de coloração chamado Gram, usando corantes derivados da anilina, algumas bactérias fixam o corante e tomam a coloração azul escuro, caracterizando as Gram positivas; outras bactérias não fixam o corante e tomam a cor vermelha do solvente usado, caracterizando as Gram negativas), são imóveis, não são encapsulados (o que dificulta a ação de alguns antibióticos), não formam esporos e são parasitos intracelulares facultativos. Existem quatro espécies principais: a Brucella melitensis, a mais comum, encontrada nas cabras, ovelhas e camelos, a B. abortus, dos bovinos, a B. suis, do porco e a B. canis, dos cães, todas capazes de serem transmitidas ao homem. A B. neotomae, dos roedores, e a B. ovis, das ovelhas somente infectam os animais e não constituem zoonoses. Os porcos e os bovinos são resistentes à B. canis e as gatas podem apresentar bacteremias quando infectadas experimentalmente pela mesma bactéria mas não abortam.

A brucelose tem uma distribuição universal. Somente a Noruega, a Suécia, a Finlândia, a Dinamarca, a Islândia, a Suíça, as Repúblicas Checa e Eslovaca, a Romênia, o Reino Unido, incluindo as Ilhas do Canal da Mancha, a Holanda, o Japão, Luxemburgo, Chipre, a Bulgária e as Ilhas Virgens estão livres da doença. Nesses países somente casos humanos esporádicos aparecem em fazendeiros, trabalhadores em açougues e frigoríficos, veterinários e caçadores.

As bactérias vivem mais de 8 semanas no queijo fresco de leite não pasteurizado, sobrevivem à refrigeração, são viáveis no solo seco, contaminado pela urina, fezes, secreções vaginais e produtos da concepção, por mais de 40 dias e por maior tempo no solo úmido, sobrevivem por mais de 3 semanas nas carcaças congeladas e aos procedimentos da fabricação do presunto.

A transmissão da brucelose ao homem é feita principalmente pelo leite ou derivados não pasteurizados, inclusive sorvetes e pelo consumo de carne crua. A penetração das bactérias por via inalatória ocorre principalmente nas crianças e profissionais que lidam com os animais contaminados. A invasão da brucela pode ocorrer diretamente pelo olho, nasofaringe e genitálias. Endemias em canis podem ser desencadeadas pela excreção de muitos microorganismos nas secreções genitais e pelo leite, possibilitando a transmissão horizontal e vertical.

Os filhotes podem ser contaminados ainda dentro do útero ou pelo leite da cadela portadora da brucelose.

Após penetrarem por uma mucosa (oronasal, conjuntival, genital), ou mesmo por lesões da pele, as brucelas chegam aos nódulos linfáticos e tecido reticuloendotelial, multiplicando-se dentro de várias células como os macrófagos e as hemácias. A imunidade, propiciando a defesa do organismo contra as bactérias, depende essencialmente da multiplicação dentro dos polimorfonucleares e macrófagos após serem fagocitadas. Nos hospedeiros nativos as brucelas não são mortas dentro dos fagocitos propiciando uma reação imunológica de maiores proporções.

Ao contrário do que ocorre com muitos outros organismos, a barreira de defesa inespecífica contra as brucelas, como a ação dos leucócitos polimorfonucleares e aglutininas não específicas, não é muito eficiente. Assim, a defesa fica restrita às reações específicas que dependem, como visto acima, da multiplicação intracelular das bactérias.

Os elementos específicos responsáveis pela defesa orgânica contra as brucelas são as opsoninas, precipitinas, aglutininas e anticorpos fixadores de complementos. A interleucina 12(IL-12) induz a defesa pelo estímulo das células T produtoras de interferon. Dos anticorpos séricos, que circulam pelos líquidos orgânicos, a imunoglobulina M específica (IgM) surge na primeira semana de doença e declina num período de três meses e a imunoglobulina G específica aumenta num período de duas a três semanas e persiste por longo tempo nos casos não tratados ou parcialmente tratados, mesmo perfil apresentado pela imunoglobulina A(IgA). Como em outras doenças, o encontro de IgM específica sugere doença ativa, enquanto o aumento da IgG mostra doença já de evolução crônica.

Na sua luta contra a doença, o organismo induz à resposta inflamatória que termina na formação de granulomas principalmente no fígado, baço, nódulos linfáticos e medula óssea. Pode haver orquite intersticial(inflamação do testículo) com áreas de fibrose e atrofia fibróide, endocardite com vegetações nas valvas cardíacas, lesões granulomatosas no miocárdio e envolvimento do cérebro, rins e pele.

Importante que somente a metade dos acometidos pela brucelose apresentam manifestações clínicas. Após um período de incubação de uma a três semanas, ou até de vários meses, surgem manifestações iguais às encontradas em todas as doenças febris : febre com características de remitência, dores articulares, fraqueza, fadiga, perda de peso, falta de apetite, dor de garganta e tosse seca que surgem subitamente em três dias ou mais gradualmente num espaço de uma semana.

A doença pode ser suspeitada se houver história de exposição a produtos ou animais contaminados pelas brucelas. Os anticorpos específicos podem ser detectados por métodos como o standard tube agglutinins (STA) e o enzyme linked immunosorbent assay (ELISA). Os antígenos da B. abortus apresentam reação cruzada com a B. melitensis e a B. suis, sendo usados no diagnóstico imunológico dessas doenças, não têm o mesmo comportamento com a B. canis que somente reage a antígenos específicos. A cultura do sangue apresenta sensibilidade de 75% se for feita na fase aguda, aumentando a sensibilidade para 90% nas culturas de medula óssea. As brucelas também podem ser encontradas em culturas de materiais dos fetos abortados, da placenta, do sêmem ou dos corrimentos vulvovaginais.Os meios de cultura devem sofrer o acréscimo de CO2 para aumentar a sua sensibilidade. Devido ao crescimento lento das colônias de brucelas, a cultura deve ser realizada por prazo de, pelo menos, quatro semanas e não apenas 7 a 10 dias como de costume. As lesões ósseas podem ser diagnosticadas pela cintilografia, especialmente indicada para o diagnóstico das lesões iniciais na espinha, pela ressonância magnética, pela tomografia computadorizada e mesmo, em alguns casos, pelo RX convencional.

Os resultados dos tratamentos nem sempre são satisfatórios, havendo muitos casos de recidivas. Hoje, são usadas associações de antibióticos como tetraciclinas (como a doxiciclina) e aminoglicosídeos (como a gentamicina ou a netilmicina) seguidas por doxiciclina mais rifampicina (de marcada atuação nas formas neurológicas e nas endocardites). Alguns autores apregoam o uso das fluoroquinolonas e das cefalosporinas de terceira geração como a ceftriaxona. Na gravidez é indicada a associação da rifampicina com sulfa+trimetroprima.

Até aqui, tudo bem. Assunto, medidas diagnósticas e tratamentos exclusivamente da área dos veterinários que devem sempre ser consultados. Não trate os seus animais sem a orientação profissional.

Aos criadores cabe a tarefa de evitar a entrada da doença no seu canil. Se acontecer será muito difícil livrar-se definitivamente dela. Portanto, todo cuidado é pouco:

Embora não seja doença muito comum no Brasil, a importação de animais de países onde a brucelose canina é mais encontrada exige muita atenção. Se possível, exija testes diagnósticos antes da compra ou, pelo menos, antes de anexar o animal ao seu plantel.

Seria interessante submeter os padreadores periodicamente aos testes imunológicos. O macho contaminado pode tornar-se estéril, devido a inflamação da próstata e do epidídimo, e contaminar as fêmeas durante as coberturas. O macho infectado pode contaminar o canil pelas brucelas eliminadas,durante anos, pelo sêmem e pela urina. Em vários países, como EEUU e Argentina, criadores exigem testes imunológicos, realizados no máximo até um mês antes da cobertura, das cadelas que serão cobertas por seus padreadores. As cadelas infectadas, mesmo aparentemente sãs, eliminam grande quantidade de brucelas nas secreções vaginais estrais. Além da possibilidade da contaminação durante a cobertura, o ato de lamber e cheirar a vulva da cadela pode levar ao contágio pela mucosa oronasal ou conjuntival. Para o controle inicialmente é suficiente um teste de aglutinação em lâmina disponível no comércio. É um método fácil de ser feito, relativamente econômico e, se for negativo, há grande probabilidade do animal não estar contaminado. Já os resultados positivos, por não ser o método muito específico, devem ser confirmados por métodos específicos.Como em toda a doença, há um período desde a exposição do animal até que os anticorpos sejam detectáveis nos exames. Na brucelose esse período é de, mais ou menos, um mês e o teste de aglutinação em lâmina negativo deve ser repetido após trinta dias. Os produtos de abortos, fetos mortos, restos placentários,etc., devem ser testados para brucelose, inclusive com culturas. Do mesmo modo devem ser estudadas ninhadas cujos filhotes morreram em grande número nos primeiros dias.

Um macho contaminado deve ser retirado da criação mesmo após tratamento adequado. Mesmo havendo provas que uma cadela contaminada pode gerar filhotes sãos, creio que as cadelas portadoras de brucelose, por melhores que sejam, devem ser retiradas da criação. Alguns autores sugerem a castração de todos os animais contaminados.

Os filhotes de fêmeas com diagnóstico de brucelose durante a gestação devem ser acompanhados constantemente por exames clínicos e testes laboratoriais. O manuseio de filhotes nascidos mortos, mortos precocemente após o nascimento, das secreções vaginais e produtos de abortos e dos corrimentos das cadelas deve ser feito com extremo cuidado e usando luvas. Se possível devem ser incinerados ou enterrados profundamente conforme orientação do veterinário. Usar botas para entrar nos canis.

Conclusão. A finalidade da matéria deste boletim é alertar os criadores sobre uma doença pouco conhecida da maioria deles até mesmo por não haver uma literatura muito rica. Apesar de não ser uma doença muito comum nos criatórios de cães no Brasil, a brucelose reveste-se de grande importância por: 1- Possibilidade de ser transmitida do cão ao homem; 2- Não existir, até o momento, vacina para a prevenção; 3- Ser uma doença insidiosa, facilitando o alastramento entre os animais sem o aparecimento de sintomatologia ou com sintomatologia muito pobre; 4- Por suas características biológicas, principalmente a reprodução intracelular, a efetividade do tratamento da brucelose ser sempre uma incógnita; 4- Apesar de não ser comum, a brucelose pode ser introduzida em qualquer canil prejudicando um trabalho de seleção de anos.

2- IMPORTAÇÃO.

Chegaram as duas cadelas da chamada linha de trabalho importadas da Alemanha pelo diretor de criação do Núcleo de Cruzeiro, José Carlos Pereira, e o Sérgio de Oliveira, de S. José dos Campos. São criação do conceituado canil vom Karthago, excelência nessa linha de pastores alemães. Duas lindas filhotas, bem anguladas, cinzas e de ótimos temperamentos. Os pais, Dirk Mara Dirk v.d. Bayuwaren e Mara v. Preussenstein (filha do sieger 95, Okar v. Karthago), são cinzas, com RX normal e com fenotipo para não fazer feio em exposições de estrutura. Cremos ter aberto uma nova porta para outras importações. Voltarei ao assunto. 

Dr. José Carlos Pereira, Diretor de Criação

 

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